A Condição Humana, de Hannah Arendt
Se o homem soubesse que o mundo acabaria quando ele morresse,
ou logo depois, esse mundo perderia toda a sua realidade, como a perdeu para os
antigos cristãos, na medida em que estes estavam convencidos de que as suas
expectativas escatológicas seriam imediatamente realizadas. A confiança na
realidade da vida, pelo contrário, depende quase exclusivamente da intensidade
com que a vida é experimentada, do impacte com que ela se faz sentir.
Esta intensidade é tão grande e a sua força é tão elementar
que, onde quer que prevaleça, na alegria ou na dor, oblitera qualquer outra
realidade mundana. Já se observou muitas vezes que aquilo que a vida dos ricos
perde em vitalidade, em intimidade com as «boas coisas» da natureza, ganha em
refinamento, em sensibilidade às coisas belas do mundo. O fato é que a
capacidade humana de vida no mundo implica sempre uma capacidade de transcender
e alienar-se dos processos da própria vida, enquanto a vitalidade e a vigor só
podem ser conservadas na medida em que os homens se disponham a arcar com o
ônus, as fadigas e as penas da vida.
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