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quinta-feira, 23 de abril de 2015
O MAL DA ROTINA.
De que vale a vida,
penso eu, se não arriscarmos, nos entregarmos ao novo? Ter o coração partido e
se fechar para um novo amor, permanecer num emprego que te causa infelicidade,
mas que garante estabilidade, dormir cedo sempre, nunca se atrasar, ir ao mesmo
cinema, frequentar as mesmas praias, estranhar novas amizades: que perda de
tempo. Toda revolução sofre um pouco de resistência no inicio - mesmo que a
revolução seja mudar de cafeteria ou de marca de sabão em pó - mas pequenas
ações podem resultar em mudanças positivas na nossa vida.
Seu Jorge já
cantarolava, abençoado por uma melodia de Chico Buarque: "Todo dia ela faz
tudo sempre igual/ me sacode às seis horas da manhã/ me sorri um sorriso
pontual/ e me beija com a boca de hortelã". Ambos os amantes não pareciam
incomodados com a rotina que o casal compartilhava, e a composição não deixa
transparecer qualquer desconforto com o cotidiano previsível. Mas e se ela o
acordasse um pouco antes para cobrir-lhe de beijos com gosto de... Maçã? Se não
sorrisse ao acordá-lo, mas o pegasse desprevenido com cócegas que o fizesse
perder o ar de tanto rir? E se ele faltasse no trabalho, um dia que seja, para
brindar a vida na companhia da amada?
Gostar de rotina não é
algo ruim. Precisamos dela para nortear nossas vidas, dar linearidade ao nosso cotidiano,
nos tirando do caos e auxiliando-nos a dar foco às metas. A rotina é a nossa
cura da ressaca, nosso mais do mesmo que precisa existir, nossa obediência às
regras, nossa submissão ao tempo, nossa dose de normalidade diária.
Sair da rotina, do óbvio,
é um tanto doloroso para algumas pessoas. Arriscar-se numa atividade nova,
atrasar-se mais que cinco minutos, um feriado no meio da semana (acredite: há
quem não goste nem um pouco de feriado que tire da mesmice de uma semana de
trabalho) nem sempre é fácil de encarar. Ainda mais pra quem trabalha com o
método da agenda: acordar às seis, ler as notícias acompanhado de uma xícara de
café - nem muito quente, nem frio, nem morno: acertar o ponto todas as vezes é
crucial e rotineiro, por assim dizer - tomar um banho rápido, vestir-se e
chegar no trabalho às oito. Nem sete e cinquenta e dois, nem sete e cinquenta e
nove, muito menos oito e um. Oito. Trabalhar incessantemente, voltar pra casa
(pelo mesmo caminho de sempre), assistir qualquer porcaria na televisão,
dormir. Fim de semana é almoçar na mãe, ir ao cinema, voltar antes que escureça
dormir.
Pessoas assim não se
permitem experimentar algo novo e ousado, por mais simples que seja. Por mais
que a mídia tenha explorado e criticado positivamente aquela peça que está em
cartaz todas as quartas, não é digno se dar ao luxo de fazer um programa
cultural em plena quarta-feira. Amanhã é quinta, dia de labutar. Às oito em
ponto. Por mais que delivery de pizza seja prático, rápido e barato, não custa
nada explorar os demais restaurantes da cidade, levar a garota ou o garoto para
degustar sushi, comida chinesa, tailandesa, ou churrasco gaúcho, que seja. Algo
que não venha engordurado dentro de uma caixa de papelão
.
Há quem não goste de
acampar na praia mas que nunca sequer dormiu dentro de uma barraca e protege-se
dos pés à cabeça do sol, da areia e da água salgada que resseca e quebra o
cabelo. Tem gente que detesta balada, porque sempre frequentou a mesma casa
noturna, que conta sempre com a presença dos mesmos Dj's, sempre com as mesmas pessoas. Há quem não
goste de beber, mas que nunca bebeu, que não goste de redes sociais e que
sempre conservou a velha conta de e-mail no Bol., que não goste de chuva mas
que nunca sentiu a deliciosa sensação da água refrescando o corpo num dia de
calor infernal, que não gosta de música brasileira mas que nunca se arriscou a
ouvir os mestres da MPB - e que, inclusive, critica ferozmente o nosso funk mas
que dança de forma frenética ao som do pop e do Hip Hop americano que faz
apologia às drogas e ao sexo, com letras tão "proibido nas" quanto as
do ritmo carioca.
De que vale a vida,
penso eu, se não arriscarmos, nos entregarmos ao novo? Ter o coração partido e
se fechar para um novo amor, permanecer num emprego que te causa infelicidade
mas que garante estabilidade, dormir cedo sempre, nunca se atrasar, ir ao mesmo
cinema, frequentar as mesmas praias, estranhar novas amizades: que perda de
tempo.
Durante muito tempo fui
um pouco assim, e confesso que ainda sou paranoica com horários e rotina, mas
estou tentando mudar. Reconhecer que a minha bolha é limitada e que a zona de
conforto não nos oferece nada mais que conforto é o primeiro passo. Toda
revolução sofre um pouco de resistência no inicio - mesmo que a revolução seja
mudar de cafeteria ou de marca de sabão em pó - mas pequenas ações podem
resultar em mudanças positivas na nossa vida.
Se o café está bem
quente, eu acho bom. Se estiver morno, me incomodo um pouco, mas engulo feliz. Se
tiver suco, agradeço: mais um dia sem cafeína. Viver metodicamente é não viver,
ou viver pela metade. Você por acaso sabe se existe vida após essa aqui? Melhor
não desperdiçar. Hortelã pode ser bom, mas há uma infinidade de sabores por aí.
Obvious
quinta-feira, 16 de abril de 2015
O QUE É O TEMPO?
A reflexão filosófica
de Agostinho sobre o tempo é uma de suas mais brilhantes análises filosóficas,
a qual o torna, embora sendo um pensador medieval, muito mais contemporâneo do
que muitos outros da atualidade. O modo como Agostinho expõe suas interrogações
com relação ao tempo marca a reflexão ocidental até os dias de hoje.
Questiona Agostinho:
“Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem o poderá
apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras o
seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do
que o tempo? Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos
também o que nos dizem quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o
tempo? Se ninguém me perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a
pergunta, já não sei.”²
Agostinho defronta-se
com algumas dificuldades principais ao falar sobre o tempo: não podemos
apreendê-lo, pois o tempo nos escapa, não conseguimos medi-lo. E também não
podemos percebê-lo.
domingo, 5 de abril de 2015
quinta-feira, 2 de abril de 2015
Não importa o que fizeram com você. “O que importa é o que você faz com aquilo que fizeram com você.”
Uma verdadeira lição de vida. Todos nós
passamos por arranhões e quedas na vida. Nesse filme chamado existência humana,
torna-se praticamente impossível sairmos ilesos por mais que sejamos protegidos
na infância, adolescência e vida adulta. Seria o mundo um lugar cruel? Não
necessariamente. Depende da formação, da personalidade e da estrutura familiar
de cada um de nós. Esses são os pilares básicos para construirmos pouco a pouco
a consciência necessária para nos adaptarmos as circunstancias da vida. Ora,
não desejamos certos acontecimentos para nós, no entanto eles acontecem. Uma
criança órfã certamente não desejaria ser órfã, mas vítima das circunstancias,
do destino, da sociedade ou da família ela é. E como lidar com isso? Como lidar
com essa série de acontecimentos que nos atinge a todos, cada um de uma forma e
não depende de nós escaparmos dela ou não? Outro caso seria uma pessoa
acometida com uma doença grave, cujas causas ela não procurou. Somado a esses
pensamentos dir-se-ia que somos todos vitimas? Claro que não. Mas somos
obrigados a concordar que há situações chave em nossas vidas que são como
acontecimentos fatais; Não depende de nós alterarmos a rota daquele
acontecimento. Mais uma vez surge a pergunta: E o que fazer mediante a isso?
Cada um digere de uma forma. Uns utilizam-se da desgraça para tornarem-se
pessoas ainda melhores e servirem de exemplo ao mundo de como é possível ser
feliz mesmo com restrições físicas, financeiras ou emocionais. Outros se
utilizam das mesmas dificuldades para revoltar-se contra o destino, contra as
pessoas, contra Deus. A ideia dessa reflexão não é expor como cada um deve agir
perante as dificuldades da vida, mas sim uma nuance de como as pessoas reagem
diferentemente diante de circunstâncias parecidas. O que fazemos com aquilo que
fazem conosco?
Já paramos para pensar
como nos sobressaímos em situações de mágoa, traição, inveja, ciúme,
desrespeito? Claro que esses tipos de situações podemos nos esquivar, peneirando
as nossas relações. Mas é impossível fugir de tudo. Já na infância em contato
com outros coleguinhas na escola percebemos o quanto as pessoas podem ser
cruéis umas com as outras, seja na prática do bullying, da intolerância, do
preconceito racial ou social. Como se sobressair, para além de um divã de um
psicólogo, ou consultas psiquiátricas toda a intempérie de contrariedades que
sofremos todos os dias? O que fazemos com aquilo que fizeram conosco?
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