É possível proceder a uma análise da televisão
por diversos caminhos, de diversas maneiras. Com esse mesmo termo,
"TV", posso me referir, entre
outras coisas, tanto a um aparelho eletrônico quanto a um determinado tipo de
programação. Sendo de orientação psicanalítica a abordagem desta pequena
reflexão, a TV a que me refiro neste momento se limita a obras de ficção,
novelas, filmes, programas de auditório, reality shows, etc. Isso é, a esse
tipo de programação que diz respeito a entretenimento.
O slogan da Rede Globo,
"a gente se vê por aqui", é uma das mais perfeitas expressões sobre o
que é a televisão, neste sentido. Entretanto, a TV é muito mais do que uma
simples expressão do que somos na realidade: ela é também aquilo que
gostaríamos de ser. A TV expressa o nosso ideal de ego e, de forma análoga aos
sonhos, satisfaz de maneira "virtual" os nossos desejos
inconscientes.
As pessoas não assistem
a programas com os quais elas não se identificam. Há uma motivação psicológica,
inconsciente, que as leva a assistir determinados programas, a acompanhar
determinadas séries, seriados, novelas, etc.
O que acontece é que a
televisão cria um ambiente no qual as pessoas se sentem livres para expressar
tudo àquilo que a civilização não permite que elas expressem um ambiente no
qual se realizam todos os seus desejos, conscientes e inconscientes, os quais,
devido à repressão da civilização ou a qualquer tipo de impossibilidade de sua
atualização (no sentido Aristotélico do termo), são impedidos de alcançar
gratificação no mundo real.
Dizendo isso de outra
forma: muitas mulheres gostam de ver novelas porque ali, a mocinha com a qual
ela se identifica se casa com o personagem interpretado pelo Rodrigo Santoro,
se torna rica e vence suas adversárias no final. Ou então a mocinha pobre, que
tem uma vida difícil como a dela, "espelha" a sua própria vida na
telinha da TV e expressa as suas próprias emoções. O mesmo ocorre com programas
humorísticos. Como Freud já apontara, o humor é uma forma de nos libertarmos de
nossas inibições para expressar o que de outra forma nunca ganharia expressão.
Penso que, ao refletir
sobre a televisão, não podemos perder de vista que a TV é feita de pessoas para
pessoas, e que o slogan da Rede Globo - "a gente se vê por aqui" -
diz algo de muito profundo e verdadeiro sobre a essência da TV.
Digo isso porque é
muito comum encontrar pessoas que vivem criticando a televisão, mas que, no entanto,
não conseguem apertar o botão de desligar e abrir um bom livro. O que elas
criticam, na verdade, é a si mesmas. Elas apenas projetam na TV as suas
próprias mazelas.
Glauber Ataide